Está no epicentro atual do COVID-19, mas não perde o otimismo, apesar dos números assustadores que atingem Itália. Paulo Fonseca, treinador da AS Roma, é hoje, certamente, um homem diferente pelo que tem visto, nos últimos dias, mas, também por isso, está mais preparado para deixar uma mensagem de ânimo, mas, acima de tudo, de precaução aos portugueses.
O técnico, de 47 anos, que soma nove títulos no seu currículo, já orientou equipas como o CD Aves, o FC P. Ferreira, o FC Porto, o SC Braga e o Shakhtar Donetsk, onde se sagrou tri-campeão ucraniano, encontra-se a cumprir a primeira época ao serviço da AS Roma e lembra a obrigatoriedade de “continuarmos todos a cumprir, sem qualquer tipo de contacto com outras pessoas”, porque, só assim “os números vão acabar por melhorar” e dá como exemplo a China, “onde a situação melhorou com a quarentena.”
Como é que tem vivido estas últimas semanas em Itália?
Têm sido semanas complicadas, estamos todos em casa. Neste momento, os italianos já se aperceberam que só desta forma é que se pode parar o vírus. Os números continuam a aumentar, há cada vez mais infetados e também mais mortes. Na quarta-feira, por exemplo, morreram quase 500 pessoas, que é um número muito considerável. Existe uma preocupação generalizada da parte dos italianos e há aqui uma tentativa de mudar as coisas. Parece-me que os italianos estão sensibilizados com a situação atual e querem cumprir todas as regras para mudar o rumo deste surto que está a matar muita gente. Só podemos sair para ir ao supermercado, e o mais próximo da nossa residência. A polícia está constantemente nas ruas a controlar as saídas das pessoas e é um momento difícil.
Que outras medidas têm sido tomadas de forma a conter e prevenir a expansão deste surto?
Neste momento, o Governo está a pensar em alargar o tempo previsto para esta quarentena que inicialmente era até dia 3 de abril. Provavelmente será prolongado. Cada vez são mais rigorosos, porque os números têm vindo aumentar. Fala-se aqui que o pico que vai ser no início da próxima semana, mas vejo os italianos unidos a tentar superar este momento. Há aqui uma preocupação do governo para que se cumpram estas medidas e as pessoas estão conscientes que devem cumpri-las
Acredita que há motivos para haver esperança de que a situação vai melhorar?
Eu acredito, porque neste momento estou a ver que os italianos estão a cumprir com aquilo que lhes é pedido. Espera-se que os números venham a subir, mas se continuarmos todos a cumprir, sem qualquer tipo de contacto com outras pessoas, os números vão acabar por melhorar. Temos um grande exemplo da China, onde a situação melhorou com a quarentena. Eu acredito e estou esperançoso de que tudo vai melhorar e que nós vamos conseguir vencer esta luta.
Relativamente ao Paulo, o que tem feito para manter a forma física?
Tenho-me mantido por casa com a família. Tenho feito algum exercício físico, tenho comido mais é verdade, mas também tenho feito mais exercício. Tenho dedicado muito tempo à minha família. Nós, treinadores de futebol, não temos muito tempo para a família e, por isso, eu também estou a usufruir ao máximo o tempo para acompanhar o crescimento do meu filho mais novo, estar com a minha esposa e para fazer coisas que normalmente não fazemos juntos.
Fala com os jogadores, como está o ambiente na sua equipa?
A paragem já vai longa e não sabemos quando iremos regressar. Com esta situação, neste momento, é difícil prever quando vão começar os treinos e os campeonatos. Temos tentado controlar as atividades físicas dos jogadores, facultamos alguns equipamentos aos jogadores, tentamos controlar a alimentação e o peso e todos eles têm um programa para cumprir em casa. A Roma é um clube muito bem organizado a todos os níveis, e, neste nível do acompanhamento dos jogadores e das famílias, têm feito um trabalho fantástico.
Tem acompanhado a situação em Portugal. Como vê a capacidade de resposta do povo português?
Eu tenho acompanhado a situação em Portugal, porque estou preocupado com a minha família, mas são situações diferentes. Portugal está ainda no início deste surto, os números ainda não são tão alarmantes, embora o aumento das últimas horas já seja significativo. Foi assim que começou em Itália. O Governo português tomou as medidas certas para evitar chegar aos números que vemos atualmente em Itália, mas também com o exemplo italiano que está algumas semanas à frente foi possível antecipar algumas etapas. Em Portugal, as pessoas têm de ser consciencializar que só estando em casa é que este problema pode resolver-se. Não sei se o povo português já está consciente do sacrifício que tem de fazer, mas acredito e confio na inteligência dos portugueses e tenho a certeza de que não vão descurar este momento.
Quer deixar alguma mensagem aos portugueses?
A mensagem que eu quero deixar aos portugueses é uma mensagem simples de quem tem vivido, ao vivo, e em loco, esta situação de extrema dificuldade em Itália, o país com mais casos na Europa e atualmente no mundo. Quero dizer aos portugueses que podem evitar que as coisas cheguem a este ponto. Depende de cada um de nós, basta que cumpram o que lhes é pedido. Ainda estamos no início e ainda temos forma de evitar o que está a acontecer em Itália. Podemos escolher o nosso destino.